pra b
08:03 | Author: t

  Essa é minha última carta de amor. Mesmo que ainda goste muito do amor e muito de cartas, não me toca mais escrever cartas que repitam parágrafo após parágrafo um amor que já está obsoleto.
  Já escrevi enormes cartas que no fim troquei por uma frase, já escrevi das ridículas, as molhadas e as mentirosas. Por momentos coloquei todo o meu futuro na possível resposta de uma carta que, aliás, nunca veio. O amor sofrito, trágico, romântico, paternal e muitas vezes superficial que me acostumei a estimular não cabe mais no meu coração, de tão pequeno que esse sentimento está. Mesmo essa última carta, não vai ser como as outras. É o começo de um processo pra mim, uma tentativa de redescobrir minha relação com as pessoas e comigo mesmo.
  Porque num primeiro momento pensei em te dizer como tu foi importante pra mim, o quanto tu ensinou e como eu me arrependo de ter te machucado, todas as vezes que te machuquei. Como eu faria tudo de novo, fora os erros, e de que como lembro de detalhes lindos da nossa vida juntos, que eu poderia jurar que fez tudo valer a pena.
  Mas, dessa vez, não. Nossa relação não fez tudo valer a pena. Na realidade muitas vezes eu te massacrei com meu machismo, te oprimi mesmo que só com o olhar e nunca vi tuas tentativas desesperadas de salvar um amor que tu sabia não ter salvação. Na realidade você me ensinou alguma coisa, mas nem tanta, porque quase toda vez que tu tentava fazê-lo eu na minha insegura prepotência não quis ouvir e fui até ríspido, afim de que tu não descobrisse tão rápido que na verdade eu não sei de nada e que tu perdeu teu tempo comigo. No geral, pra ti, nossa relação não deve ter valido a pena, porque é muito difícil que isso aconteça pra qualquer mulher com qualquer homem. Então eu não consigo me sentir satisfeito por ter passado por isso, quando acho que te fiz mais mal do que bem.
  Tivemos sim, momentos muito bonitos, muito verdadeiros. Acho que essa relação me foi tão importante porque em muitos momentos mostrou o que seria uma relação humana, se não tivéssemos toda essa carcaça social apodrecida ao nosso redor. Também porque foi meu primeiro contato com uma lutadora. Não uma militante, necessariamente, mas uma garota que lutava pela vida e pela alegria que ela pode dar, uma garota que dança e que grita, por assim dizer (a primeira vez que te vi você estava brigando e gritando com alguém, afim de defender um outro, lembra?).
  Hoje, meu amor, estou começando a lutar pelo amor coletivo. Quero sinceramente amar a todos e a todas, não no sentido hippie de Amor Livre, mas no sentido político de amor fraternal, de camaradas. Relações amorosas são pequenos diamantes que vem e vão, ainda que nunca acabem, entrando no processo da vida de cada um. Hoje os elogios e declarações de amor que tenho pra ti são diferentes, vão bem mais no caminho de te admirar como ser humano do que só como mulher. Por isso, hoje te digo que foi uma honra lutar e estar ao seu lado. Foi realmente um privilégio você ter por dois anos se entregado a uma relação comigo, com sentimentos muito bonitos e uma consideração por mim muito rara. Espero, mesmo agora estando longe, poder sempre contar com seus conselhos e experiências.
  Enquanto vou chegando no final da carta vou ficando emocionado. É como se fosse chegando o momento de nos despedirmos. Imaginei essa cena já muitas vezes e dói tanto, meu bem. Sei que nesse parágrafo estou saindo da minha intenção inicial, mas tu me conhece, e eu estou começando a mudar faz pouco tempo. Eu daria um braço, os dois braços pra ter a certeza de que você vai ter a vida mais feliz possível nesse mundo de merda. Eu morreria por isso, e é o que pretendo saber.
  Lembro que no fim do nosso namoro, você dizia “não desiste de mim”. Como quem queria terminar o namoro, mas pra que eu mudasse, não porque não me amava mais. Eu desisti,por assim dizer, não mudei, cometi um dos maiores erros. Agora quero recuperar isso. Amor, amiga, nunca vou desistir de você. Prometo tentar lutar e lutar por um mundo diferente, um mundo que você não seja tão julgada e oprimida como é, até por quem te ama. Por que eu ainda amo você e vou amar por muito tempo, no sentido mais puro que consegui sentir até agora.
  Essa carta é pra  dizer que tu é linda, em todos os aspectos que conheci, que é uma pessoa com o coração muito bonito. Se você precisar de mim, por favor procure.
  Do seu,

sobre o mar
17:53 | Author: t
    Minha opinião não importa mais. O que penso ou sinto sobre aquilo é um momento de um coletivo maior, ao qual construo e que me constrói. Sei que estou mais ou menos cristalizado, na personalidade que tenho, nos que me são importantes e nos meus objetivos. Mas mesmo essa cristalização é reflexo do movimento maior que é a sociedade, o mundo e o resto do universo. Não achei respostas sobre as coisas mais insignificantes, agora sei, porque fiz as perguntas para as pessoas erradas e do jeito errado. Não quero entender o indivíduo, a psicologia resultante de cada um, fruto de seja o que for; entender a sociedade como um tipo de organismo dentro de um maior, afim de entender seus momentos (as pessoas, as pedras, o ar), é a maneira de entender nosso comportamento individual.
    Consequentemente, pessoalmente, me percebo com ainda mais serenidade frente aos últimos tristes acontecimentos. Porque foi muito bonito e para quem perguntar a respeito só terei palavras bonitas. Começar, terminar, não passam de processos parecidos aos que existem durante uma relação. Terminar e começar sempre foi traumatico pra mim, pro melhor e pro pior. Não quero que seja mais.
    Preciso responder uma coisa: não sou um grande potencial sendo desperdiçado e quem pensa assim, em algum momento, tem que perceber a efemeridade de uma opinião dessas. Tanto porque ninguém conhece ninguém em um ano, quanto mais seis meses, como porque julgar o outro é tão fácil quanto presunçoso.
    Desejo pra ti o que tivemos no melhor dos nossos momentos, todo dia, pra sempre.