procura-se
10:48 | Author: t
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    Na procura de reviver algumas coisas, só encontrei lugares vazios, praticamente abandonados. Andando por eles escuto uma voz ou outra, as vezes um grito, como se viessem do passado mas não encontrassem eco aqui para continuar vibrando. Os lugares falavam antes, mas não falam mais nada. As árvores onde riscamos os nossos nomes foram derrubadas. Não encontro mais ninguém nas ruas e sequer sei onde estão agora. O tempo passa e come tudo que não foge pro presente.

    Na entrada da casa, o mato cresce solto, no meio do lixo jogado ali pela vizinhança. Não tenho mais a chave da porta, mas ela está arrombada, quase no chão, não como se dissesse “entrem a vontade”, mas como se resmungasse que tanto faz quem entra, como entra, quando entra.
    A primeira sala está vazia e suja de poeira. Um par de pegadas em algum lugar, mostrando que raramente alguém ainda visita aquela casa, e quando o faz, faz sempre sozinho. Atrás da porta uma barraca abandonada, com buracos de queimadura e ainda cheia de areia da praia. Quando tento carregá-la, se desfaz na minha mão.
    O único quarto ainda está cheio de velharias. Algumas fotos apaixonadamente rasgadas, enquanto outras foram separadas com cuidado do lixo, tentando desesperadamente resistir ao tempo. Bitucas de cigarro e de maconha, pedaços de linha, conchas, sementes; um violão pela metade, sem as cordas, chama a atenção, por ainda estar de pé contra a parede, esperando o próximo tocar alguma coisa. Eu sento, junto as pontas e queimo um: a fumaça se adapta perfeitamente ao lugar.
    No banheiro o espelho não reflete nada. Escuto passos na entrada: corro lá para ver que não tem ninguém, ou não consigo ver ninguém. Com o tempo percebo que o barulho de passos é constante, mas ninguém se vê, ninguém se esbarra. Todos vem aqui no quarto, juntam as pontas, acendem um último pra fumar como se fumava antigamente..E vão embora. Cinco minutos, no máximo, para que não dê tempo de vermos nossa vida de hoje com os olhos de ontem. Tocamos em frente e, antes de sair, limpo a calça que sujei ao sentar no chão sujo, triste. Alguns entram no carro e vão embora, outros a pé, alguns de bike. Mas todos em direções diferentes. A casa é no fim de uma rua sem saída, ao lado de outras casas abandonadas, num bairro de praças que parece não ter ninguém.
    De qualquer forma, a casa está de pé e dificilmente pode ser derrubada. Com o tempo vai ficando mais velha, mais cheia de poeira, sendo comida pelo mato e pelos dias. Mas está lá, com as velhas fotos e com as velhas músicas. Inscrições de amores na parede, com nomes que acredito serem eternamente apaixonados, por mais estranho e absurdo que me pareça hoje aquele caso. O mundo hoje insiste que nada dura ou permanece. Mas quando estou quase na esquina, saindo do nosso quarteirão, me vem um sorriso; apesar da tristeza de não ter encontrado ninguém no caminho, foi bom saber que tudo está guardado em algum lugar, com amor, com carinho, com dor e saudade, pelo que parece, pra sempre.
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3 comentários:

On 30 de agosto de 2010 às 18:33 , M.A.A. disse...

...

(comovida, a vida se move no sentido insensato do desfacelamento... )

 
On 30 de agosto de 2010 às 18:33 , M.A.A. disse...

...

(comovida, a vida se move no sentido insensato do desfacelamento... )

 
On 16 de outubro de 2010 às 16:10 , restos: disse...

é o tempo, menina, que te come por trás sem consentimento

(e sem manteiga)