Ciclos... Estações, menarca, paridura, o tempo dando cambalhotas na tênue existência de nossa memória.
O fim e o começo misturando-se, atracados sem distinção, não há ponta, nem o primeiro passo. Só o que há é continuação. Talvez por isso a finitude não faça sentido.
Mas a finitude existe, tudo aponta pro fim, arqueja cumprir uma função e morrer.
O ano morre também, nós decidimos assim.
Que estranho, o tempo é uma roda gigante.
"Ela partiu...
Partiu... E nunca mais voltou...
(Não voltou, não)...
Ela partiu..."
Tim Maia gritava, enlouquecido. Ela sacodia o cigarro em punho, fazendo caretas como se a voz, grave e potente, lhe pertencesse.
Quanto desalinho e as plantas continuam a crescer, apesar do silêncio.
Partiu... E nunca mais voltou...
(Não voltou, não)...
Ela partiu..."
Tim Maia gritava, enlouquecido. Ela sacodia o cigarro em punho, fazendo caretas como se a voz, grave e potente, lhe pertencesse.
Quanto desalinho e as plantas continuam a crescer, apesar do silêncio.
Ela partiu de uma solidão torpe para os braços gentis das identificações. Solidificou-se, quase atenta aos movimentos circulares do afeto.
É Natal! É Natal!
Ela pensando em sexo.
É Natal!
Ela pensando em morte.
É Natal!
Ela pensando em filhos.
É Natal!
Ela pensando... E ainda é Natal...
Qualquer coisa que se faça, qualquer coisa que se sinta, que se pense, que se coma, que se vomite, que se entristeça... Será sempre... Enfim, o famigerado Natal.
Nunca entendeu o sentido da vida que nos foi dado por aquele que morreu (por nós?). Deus nos fez um favor, crucificando seu único filho. Agora estamos salvos da ira divina.
Estamos salvos! É Natal!
O sangue ainda ardia.
"Quando morrer, voltarei para buscar todos os instantes que não vivi junto do mar..."
Acordou. Em volta, o quarto a abraçar lhe os olhos. As paredes, silenciosas, leais, que antes expunham fotografias, quadros, estavam vazias. Tudo, tudo, tudo... Tudo no chão. Os joelhos sangrando e as juntas dos dedos. Bibelôs, desenhos, cartas, incensários, livros, lençóis, bolsas, roupas, discos, aparelho de som... Tudo no chão.
Acordou sobre uma cama rota, crua. Mas... Enfim, acordou. E já não podia deixar de ver o que, sob os pés lhe apontavam os cacos de seu antigo ninho. Agora antigo. Era tudo fim.
Puxou os cabelos para trás com leveza para ver com precisão. O nada estava lá, no meio de tantas coisas que ela já não reconhecia. Era só a destruição de suas guerras diárias, era só a ardência de estar viva.
Não saber viver sem explodir é uma sina dos neuróticos incompetentes. Eles têm, precisam... É tudo... Explodir. A força que falta à neurose ridícula devastou o quartel general do equilíbrio. O delírio tomou forma, ganhou razões para não se esconder, não se tolher.
Correu em busca de alguma vassoura, sacos de lixo, precisava limpar tudo, tudo! Não podia seguir observando a loucura. Precisava guardar o que restara e restaurar tudo! Mas já não havia nada além.
Quanta alucinação cabe? Quanta onda cabe? É o feminino, avisaram lhe... É o feminino puxando lhe pelos tornozelos...
A cabeça entre as mãos, os pés apontando pra dentro. (suspiro)
Acordou. Em volta, o quarto a abraçar lhe os olhos. As paredes, silenciosas, leais, que antes expunham fotografias, quadros, estavam vazias. Tudo, tudo, tudo... Tudo no chão. Os joelhos sangrando e as juntas dos dedos. Bibelôs, desenhos, cartas, incensários, livros, lençóis, bolsas, roupas, discos, aparelho de som... Tudo no chão.
Acordou sobre uma cama rota, crua. Mas... Enfim, acordou. E já não podia deixar de ver o que, sob os pés lhe apontavam os cacos de seu antigo ninho. Agora antigo. Era tudo fim.
Puxou os cabelos para trás com leveza para ver com precisão. O nada estava lá, no meio de tantas coisas que ela já não reconhecia. Era só a destruição de suas guerras diárias, era só a ardência de estar viva.
Não saber viver sem explodir é uma sina dos neuróticos incompetentes. Eles têm, precisam... É tudo... Explodir. A força que falta à neurose ridícula devastou o quartel general do equilíbrio. O delírio tomou forma, ganhou razões para não se esconder, não se tolher.
Correu em busca de alguma vassoura, sacos de lixo, precisava limpar tudo, tudo! Não podia seguir observando a loucura. Precisava guardar o que restara e restaurar tudo! Mas já não havia nada além.
Quanta alucinação cabe? Quanta onda cabe? É o feminino, avisaram lhe... É o feminino puxando lhe pelos tornozelos...
A cabeça entre as mãos, os pés apontando pra dentro. (suspiro)
"Ele não me ama!", "Ele não me ama!..." Ela repetia aos berros mentais essa trágica resolução amorosa. E coordenava os passos e o sentimento numa corrente, arrastando -se pela casa. Como se, fastiosa de viver, já fosse o próprio fantasma de si. Sentia o coração acelerar e já passava muito do meio-dia. Comer, para ela, tinha o peso da solidão de séculos. Como viver esse aleijo?
O dia passando à meia luz e, embora soubesse que lá fora arde, ela sentia frio. Os berros mentais diminuiram, música sempre ajuda... Ah, o silêncio da solidão... E todas as possibilidades que ele dá à cabeça, já não vaga.
É preciso comer e encarar a falta de apetite completa. Quase nojo, lembrava que era pecado enojar - se da comida. Seu pai a lembrava, embora estivesse longe.
Comeria. Certamente, comeria.
O coração ainda...
E dava de arrefecer a rigidez nas costas. Como dormia mal! Acordava, certos dias, ainda mais cansada. Como se dormir fosse uma batalha. Não se lembra de tempos de dormir bem, mas queixumes sobre a nuca, as cadeiras, os braços doloridos. E como lhe doíam os braços! Pareciam sempre enfraquecer, como galhos à ponto de quebrar.
Arisca, fez- se ríspida para ele.
Por que, dolorida, não costuma se expôr. Não costuma...
Ríspidez causando lhe arrepios por trás das costelas. Antes dos poros, os músculos já se arrepiavam, erissados, ciclídeos. Na rapidez de quem corta a água, ela se pôs em busca de ajuda. Por que não poderia mesmo permanecer... O coração ainda... Então.
O dia passando à meia luz e, embora soubesse que lá fora arde, ela sentia frio. Os berros mentais diminuiram, música sempre ajuda... Ah, o silêncio da solidão... E todas as possibilidades que ele dá à cabeça, já não vaga.
É preciso comer e encarar a falta de apetite completa. Quase nojo, lembrava que era pecado enojar - se da comida. Seu pai a lembrava, embora estivesse longe.
Comeria. Certamente, comeria.
O coração ainda...
E dava de arrefecer a rigidez nas costas. Como dormia mal! Acordava, certos dias, ainda mais cansada. Como se dormir fosse uma batalha. Não se lembra de tempos de dormir bem, mas queixumes sobre a nuca, as cadeiras, os braços doloridos. E como lhe doíam os braços! Pareciam sempre enfraquecer, como galhos à ponto de quebrar.
Arisca, fez- se ríspida para ele.
Por que, dolorida, não costuma se expôr. Não costuma...
Ríspidez causando lhe arrepios por trás das costelas. Antes dos poros, os músculos já se arrepiavam, erissados, ciclídeos. Na rapidez de quem corta a água, ela se pôs em busca de ajuda. Por que não poderia mesmo permanecer... O coração ainda... Então.
não digo que foi repentino, porque simplesmente foi. aconteceu. os ponteiros do relógio não pararam, enlouqueceram. a eternidade sentou-se no banco que estava no centro do vazio que há em mim, onde nem eu mesmo existo.
e foi ali que vi o grande relógio sem ponteiros nem números: um grande círculo sem centro, sem bordas, invisível e multicolorido. suas horas eram todas as direções e todos os caminhos. elas eram constituidas de metal pedra madeira água fogo e carne. uma grande carroça que navegava através de velas de chamas por caminhos não traçados e invisíveis do espaço infinito.
pássaros cegos me saudaram, sacudindo a cabeça e invadiram meus olhos. e toda a natureza perfurou meu peito como um punhal. não, não existe tempo. não existe igualmente o espaço. tampouco existe 'eu' ou existe 'você'. eu sou você, hoje e ontem por todos os momentos que hão de vir. estamos tão unidos, nós. um ser. duas águas misturadas que não pode mais se distinguir uma da outra.
não existe maior libertação que a de com tudo estar preso, conectado. eu sou um sonho que tive: árvore-espírito-de-carne.
e foi ali que vi o grande relógio sem ponteiros nem números: um grande círculo sem centro, sem bordas, invisível e multicolorido. suas horas eram todas as direções e todos os caminhos. elas eram constituidas de metal pedra madeira água fogo e carne. uma grande carroça que navegava através de velas de chamas por caminhos não traçados e invisíveis do espaço infinito.
pássaros cegos me saudaram, sacudindo a cabeça e invadiram meus olhos. e toda a natureza perfurou meu peito como um punhal. não, não existe tempo. não existe igualmente o espaço. tampouco existe 'eu' ou existe 'você'. eu sou você, hoje e ontem por todos os momentos que hão de vir. estamos tão unidos, nós. um ser. duas águas misturadas que não pode mais se distinguir uma da outra.
não existe maior libertação que a de com tudo estar preso, conectado. eu sou um sonho que tive: árvore-espírito-de-carne.
Pensei...
Mas deixei escapar.
Difícil.
Domingo passa tão quieto.
Mas deixei escapar.
Difícil.
Domingo passa tão quieto.
não é quando me inspiro
que escrevo,
mas quando piro
e inspiro o que quero falar
mas não devo.
cobro à consciência:
-paciência! tudo tem seu preço.
pego fumo e papel
entre os dedos,
dobro e acendo...
esqueço.
que escrevo,
mas quando piro
e inspiro o que quero falar
mas não devo.
cobro à consciência:
-paciência! tudo tem seu preço.
pego fumo e papel
entre os dedos,
dobro e acendo...
esqueço.
Esse amor é uma mentira
cafeína e rebordosa ao meio-dia
álcool dissipando ao sol
O mar tragando amanhecer
é a tua pele em minhas mãos
a desfalecer, quente diamante
era, de ti, amante em devoção
Sentimento mascado e engendrado
Tuas coxas para as minhas são
abraço vertendo os olhos
ver - te tendo espasmos no coração
Sorri, desgraça nua
Que sei, de mim, levas nada
Só um pedaço, carne crua
pulsando, coração e alma.
cafeína e rebordosa ao meio-dia
álcool dissipando ao sol
O mar tragando amanhecer
é a tua pele em minhas mãos
a desfalecer, quente diamante
era, de ti, amante em devoção
Sentimento mascado e engendrado
Tuas coxas para as minhas são
abraço vertendo os olhos
ver - te tendo espasmos no coração
Sorri, desgraça nua
Que sei, de mim, levas nada
Só um pedaço, carne crua
pulsando, coração e alma.
Estarei contigo em todos os trechos da estrada e em todas as noites. As terças farei rituais em nosso nome, pelo resto da eternidade. Nos encontraremos em alguma calçada, com o abraço que ainda sinto me apertando. Fui bobo ao me despedir, porque não se sabe o que fazer quando a vida se mexe com tanta força.
Do meu lado, lutarei por ti e por nós, para que nossos caminhos possam ser suaves.
Te amo, meu bom amigo. Não fique muito tempo longe.
brindemos...
Do meu lado, lutarei por ti e por nós, para que nossos caminhos possam ser suaves.
Te amo, meu bom amigo. Não fique muito tempo longe.
brindemos...
Meu amor venenoso surrupiou meus suspiros
Me deixou assim, sujeito a vicissitudes
Sibilou os sinos de meu coração
Sinais supus para entender
silhuetas sujas de teu olhar
Se não sabemos subverter
submeto meu penas às tuas mãos
Estou seguro.
Seu significado sussurra sanidades em minha boca surda.
santa sílaba a somar teu olho ao meu.
Sinto o verbo transpôr teu sangue.
Sinonímias escrevendo sonetos suaves para compôr o sonho.
Soterramentos de amor e ciúmes.
Cada verso solto cita, imita ou grita um sentimento solitário.
Me deixou assim, sujeito a vicissitudes
Sibilou os sinos de meu coração
Sinais supus para entender
silhuetas sujas de teu olhar
Se não sabemos subverter
submeto meu penas às tuas mãos
Estou seguro.
Seu significado sussurra sanidades em minha boca surda.
santa sílaba a somar teu olho ao meu.
Sinto o verbo transpôr teu sangue.
Sinonímias escrevendo sonetos suaves para compôr o sonho.
Soterramentos de amor e ciúmes.
Cada verso solto cita, imita ou grita um sentimento solitário.
dentre todos os dias ensimesmados, a fatídica rotina dos dias corroidos pelos assinadores de papel e pressionadores de pedais de caixas metálicas móveis, ele dedicou umas poucas horas para a reorganização dos seus livros postos sobre a prateleira ao lado da cama.
cada um deles o tinha marcado profundamente. nunca fora de ir atrás de leituras, os livros e os escritos pareciam simplesmente o buscar. ficava somente aquela sensação de que sempre aqueles livros estavam lá. talvez o fato de não se buscar algo, faz com que esse algo faça profundamente parte de si mesmo.
com o devido cuidado, pegava cada um deles como se fosse um filho, ou um pai, um mestre. através deles lembrava-se do que nunca soubera. folheava os livros como páginas do romance de sua existência, um albúm, um porta-retrato onírico-existencial.
"o senhor sabe o que é o silêncio? é a gente mesmo, por demais..."
foi o que lhe passou pela cabeça ao se deparar com aquele romance que nunca terminou. Grande Sertão...o sertão é do tamanho do mundo...e o sertão é a gente mesmo. ao contrário do que se pensa, nos definimos e somos compostos pelos silêncios que trazemos, não pelo que falamos. o silêncio é a chave.
"circunda-te de rosas, ama, bebe e cala. o mais é nada."
Pessoa sabia do que falava. e ele a fazia lembrar. folearam certa vez um grande volume, capa avermelhada. não que possuísse nada de seu, mas o que ainda lhe restava dela eram poucas lembranças. e não entendia muito bem porque isso ainda o atormentava.
não entendia porque queria entender. entender limita, estreita a visão. talvez por isso, pouco conversavam. não a conhecia de uma forma convencional. todas as outras pessoas ocupam-se de se conhecer através do que o outro pensa, despensa...do que gosta, do que desgosta...
talvez o maior motivo de lhe devotar tamanha admiração e carinho seja justamente o fato de que ambos se importaram em sentir o outro. ele do seu lado, não se limitou, não a buscou naquilo que idiotamente se formalizou em chamar "conhecer". procurou-a através dos sentidos, dos sentimentos, além das palavras.
"o essencial é invisível aos olhos." e é de um livro infantil que se tiram as maiores lições da vida. crianças não entendem muito bem conceitos. elas não se preocupam se você fala uma coisa assim ou assado. ela simplesmente gosta de você ou não. ela te sente. e sentir é algo que os adultos desaprenderam.
qualquer contato que se tenha com qualquer pessoa é superficial...somente alguns poucos se preocupam em sentir aquilo que você transmite.
durante o curto período que esteve na companhia dela, foi isso o que fez. sentiu. e quando sentiu, sentiu sem pudor, sem limites. ali estava ele, ali ela estava. não precisava de mais nada. a busca do entendimento daquele sentimento fez ruir tudo o que estava sendo despertado. o além...o por trás...o invisível. vislumbrou.
talvez o mau agouro de dizer as palavras (hoje em dia não mais tão) mágicas assim o tenha distanciado: eu te amo. era isso que queria dizer afinal. não disse. a olhou, olhou estarrecido aqueles olhos amendoados, que lhe penetraram a carne e tudo aquilo que mantinha o funcionamento normal do organismo. deslumbrou-se. descobriu-se. e o vento levou...
cada um deles o tinha marcado profundamente. nunca fora de ir atrás de leituras, os livros e os escritos pareciam simplesmente o buscar. ficava somente aquela sensação de que sempre aqueles livros estavam lá. talvez o fato de não se buscar algo, faz com que esse algo faça profundamente parte de si mesmo.
com o devido cuidado, pegava cada um deles como se fosse um filho, ou um pai, um mestre. através deles lembrava-se do que nunca soubera. folheava os livros como páginas do romance de sua existência, um albúm, um porta-retrato onírico-existencial.
"o senhor sabe o que é o silêncio? é a gente mesmo, por demais..."
foi o que lhe passou pela cabeça ao se deparar com aquele romance que nunca terminou. Grande Sertão...o sertão é do tamanho do mundo...e o sertão é a gente mesmo. ao contrário do que se pensa, nos definimos e somos compostos pelos silêncios que trazemos, não pelo que falamos. o silêncio é a chave.
"circunda-te de rosas, ama, bebe e cala. o mais é nada."
Pessoa sabia do que falava. e ele a fazia lembrar. folearam certa vez um grande volume, capa avermelhada. não que possuísse nada de seu, mas o que ainda lhe restava dela eram poucas lembranças. e não entendia muito bem porque isso ainda o atormentava.
não entendia porque queria entender. entender limita, estreita a visão. talvez por isso, pouco conversavam. não a conhecia de uma forma convencional. todas as outras pessoas ocupam-se de se conhecer através do que o outro pensa, despensa...do que gosta, do que desgosta...
talvez o maior motivo de lhe devotar tamanha admiração e carinho seja justamente o fato de que ambos se importaram em sentir o outro. ele do seu lado, não se limitou, não a buscou naquilo que idiotamente se formalizou em chamar "conhecer". procurou-a através dos sentidos, dos sentimentos, além das palavras.
"o essencial é invisível aos olhos." e é de um livro infantil que se tiram as maiores lições da vida. crianças não entendem muito bem conceitos. elas não se preocupam se você fala uma coisa assim ou assado. ela simplesmente gosta de você ou não. ela te sente. e sentir é algo que os adultos desaprenderam.
qualquer contato que se tenha com qualquer pessoa é superficial...somente alguns poucos se preocupam em sentir aquilo que você transmite.
durante o curto período que esteve na companhia dela, foi isso o que fez. sentiu. e quando sentiu, sentiu sem pudor, sem limites. ali estava ele, ali ela estava. não precisava de mais nada. a busca do entendimento daquele sentimento fez ruir tudo o que estava sendo despertado. o além...o por trás...o invisível. vislumbrou.
talvez o mau agouro de dizer as palavras (hoje em dia não mais tão) mágicas assim o tenha distanciado: eu te amo. era isso que queria dizer afinal. não disse. a olhou, olhou estarrecido aqueles olhos amendoados, que lhe penetraram a carne e tudo aquilo que mantinha o funcionamento normal do organismo. deslumbrou-se. descobriu-se. e o vento levou...
Ainda é cedo, amor
Mal começaste a conhecer a vida
Já anuncias a hora de partida
Sem saber mesmo o rumo que irás tomar
Preste atenção, querida
Embora eu saiba que estás resolvida
em cada esquina cai um pouco tua vida
Em pouco tempo não serás mais o que és
Ouça-me bem, amor
Preste atenção o mundo é um moinho
Vai triturar teus sonhos tão mesquinhos
Vai reduzir as ilusões a pó
Preste atenção, querida
De cada amor tu herdarás só o cinismo
Quando notares estás à beira do abismo
Abismo que cavaste com os teus pés
Cartola
Mal começaste a conhecer a vida
Já anuncias a hora de partida
Sem saber mesmo o rumo que irás tomar
Preste atenção, querida
Embora eu saiba que estás resolvida
em cada esquina cai um pouco tua vida
Em pouco tempo não serás mais o que és
Ouça-me bem, amor
Preste atenção o mundo é um moinho
Vai triturar teus sonhos tão mesquinhos
Vai reduzir as ilusões a pó
Preste atenção, querida
De cada amor tu herdarás só o cinismo
Quando notares estás à beira do abismo
Abismo que cavaste com os teus pés
Cartola
Percebi de longe seus cabelos louros, louríssimos - quase - brancos. O sol dava a impressão de irrealidade em torno dela e de seus fios pálidos. As unhas vermelhas brigavam com as mãos levemente suadas e gélidas.
Quando nos tocamos, foi tudo poesia. O negativo de mim. Sem cor, a refletora de todas as luzes.
Eu acordei para um desejo que me constituía, despertei sedenta de uma anemia aguda e fértil, uma fraqueza que permite a circulação do sangue. Faz pulsar, antes um coração frágil, mas atento.
Retorno, cheia de ócio. Energia fervento, inquietando o que nunca foi estático. As bobagens são assunto, o dia. Haja lábios para morder, unhas para limar, tempo pra se perder.
Muito tempo para as mãos.
Quando nos tocamos, foi tudo poesia. O negativo de mim. Sem cor, a refletora de todas as luzes.
Eu acordei para um desejo que me constituía, despertei sedenta de uma anemia aguda e fértil, uma fraqueza que permite a circulação do sangue. Faz pulsar, antes um coração frágil, mas atento.
Retorno, cheia de ócio. Energia fervento, inquietando o que nunca foi estático. As bobagens são assunto, o dia. Haja lábios para morder, unhas para limar, tempo pra se perder.
Muito tempo para as mãos.
nos buraco abertos no peito
plantam-se sementes.
na árvore que nos tornaremos,
pássaros já fazem ninhos
alegremente.
vislumbre de um campo
de girassóis.
vi ver de amor.
plantam-se sementes.
na árvore que nos tornaremos,
pássaros já fazem ninhos
alegremente.
vislumbre de um campo
de girassóis.
vi ver de amor.
("O tempo, meu dilema, vai arrastando meus preciosos segundos, feito correnteza. vai corroendo, fazendo de mim um grande museu de pequenas coisas...")
no meio do quarto vazio, estava sentado confortavelmente numa almofada, despido de tudo que não fossem lembranças e um fino lençol. já passava de 4 horas e meia da manhã. a chuva tempestiva talvez fosse a causa de constantes quedas de luz e parecia que ia custar a passar. os relâmpados...eles eram os flashes das suas fotografias mentais, lembraças tão vivas que pareciam ter ocorrido há poucos instantes atrás...
- estranho, até parece que foi agora há pouco...- e só se ouvia o barulho de chuva, dos trovões e do coração palpitante.("O tempo, meu dilema, vai arrastando meus preciosos segundos, feito correnteza. vai corroendo, fazendo de mim um grande museu de pequenas coisas...")
palavra por palavra, parecia marcar-lhe de tal forma absurda, que nem se lembrava mais...não lembrava mais daquela boca...do som da voz manhosa e rouca...dos movimentos tão expressivos dos lábios carnudos e, no entanto, relutantes de se expressar...da maciez da pele ao redor da boca, que lhe cobria todo o resto do corpo, tão pálido e brilhante sob a luz do luar...do corpo emaranhado nos lençóis e nos seus braços e pernas...
("O tempo, meu dilema, vai arrastando meus preciosos segundos, feito correnteza. vai corroendo, fazendo de mim um grande museu de pequenas coisas...")
aquela frase simplesmente surgiu. e, como se o mundo o todo o atravessasse, penetrando sua carne por todos os poros, estancou. o mundo parecia paralizado. se se virasse, o mundo também viraria. se ele virasse o rosto pra direita, o mundo vinha pra esquerda. levantou-se. o mundo, se abaixou. a cada passo que dava o mundo saia do lugar. e assim como o mundo o trespassava tal qual punhal, expandia-se também em direção contrária...o seu eu mais íntimo, quase inalcançável, expandia e fundia-se a tudo que não era ele próprio.
("O tempo, meu dilema, vai arrastando meus preciosos segundos, feito correnteza. vai corroendo, fazendo de mim um grande museu de pequenas coisas...")
o tempo parecia não ter mais tanta importância. tudo estava justamente onde devia estar. a distância serviu-lhe de abrigo. a solidão de companhia. a saudade lhe trouxe gratidão. o coração acelerado, aquietou-se...e assim pode aproveitar melhor a chuva.
Fiquei velho esperando. Envelhecer é perder as lembranças e eu as perdi, quase todas, ao longo dos dias. Para onde fui, não haviam mais varandas ou janelas para vê-la e sorrir com ela. Comecei a sonhar com isso e a amava por toda a noite, para acordar chorando de saudade, com o cheiro dela nas mãos. Foram longas essas manhãs. Lembrava de madrugadas, da areia da praia nos seus pés, dá água do mar no seu corpo, da cor de mel...Até que parei de sonhar.
Andei nas ruas, em bares, rodinhas de violão e risadas, na praia; andava bestamente, mas sempre procurando o sonho que havia esquecido em algum lugar. Vi umas rosas, alegrias e amores que lembravam o sorriso dela. Então eu conseguia sonhar mais um pouco e acordar com um pedaço do som da sua voz. Mas até essas pequenas memórias as perdi em algum lugar.
Agora estou velho e nem enxergo direito. Passo dias e noites com a cabeça vazia de tudo, esperando. Acordo cedo, com as dores, sentindo falta de alguma coisa mas sem saber o que é. As vezes vou até a praia, sento na beira da água e o cheiro do mar e da areia me fazem chorar. Na volta, me acomodo na calçada de casa e olho para as varandas em frente, esperando que alguma coisa aconteça. Nada mudou nos últimos anos, nada aconteceu. Mas a saudade do que éramos, na verdade só a saudade, me faz esperar todas as manhãs pelo antigo novo dia...
Andei nas ruas, em bares, rodinhas de violão e risadas, na praia; andava bestamente, mas sempre procurando o sonho que havia esquecido em algum lugar. Vi umas rosas, alegrias e amores que lembravam o sorriso dela. Então eu conseguia sonhar mais um pouco e acordar com um pedaço do som da sua voz. Mas até essas pequenas memórias as perdi em algum lugar.
Agora estou velho e nem enxergo direito. Passo dias e noites com a cabeça vazia de tudo, esperando. Acordo cedo, com as dores, sentindo falta de alguma coisa mas sem saber o que é. As vezes vou até a praia, sento na beira da água e o cheiro do mar e da areia me fazem chorar. Na volta, me acomodo na calçada de casa e olho para as varandas em frente, esperando que alguma coisa aconteça. Nada mudou nos últimos anos, nada aconteceu. Mas a saudade do que éramos, na verdade só a saudade, me faz esperar todas as manhãs pelo antigo novo dia...
Estava, finalmente, velha. Seu coração arrefeceu as dores e pôde, passados séculos dar-lhe a mansidão que só o cansaço é capaz. Envelhecer é sentir dores. E ela as sentia, todos os dias. nas costas, joelhos, pescoço, nos olhos.
Acordava na justa hora, 4: 45 da manhã, minutos antes do sol nascer. Prostrava-se, pálida, na calçada com um casaquinha rosa-bebê (é sempre bom proteger os pulmões do ar frio) e seus chinelos velhos, confortáveis. Esperava.
Em silêncio, com uma boca débil e dedos trêmulos sentia sol arder lenta e progressivamente. Sem piedade, tomando todas as coisas vivas como um território seu. Todas as manhãs ela chorava. O mundo dormir, com exceção de poucos carros. E ela debulhava pequenos grãos de lágrima, emocionados pelo calor.
Acordava na justa hora, 4: 45 da manhã, minutos antes do sol nascer. Prostrava-se, pálida, na calçada com um casaquinha rosa-bebê (é sempre bom proteger os pulmões do ar frio) e seus chinelos velhos, confortáveis. Esperava.
Em silêncio, com uma boca débil e dedos trêmulos sentia sol arder lenta e progressivamente. Sem piedade, tomando todas as coisas vivas como um território seu. Todas as manhãs ela chorava. O mundo dormir, com exceção de poucos carros. E ela debulhava pequenos grãos de lágrima, emocionados pelo calor.